sexta-feira, 28 de março de 2014


BYE BYE BRASIL


POR ENILTON GRILL



Vi na praça de União dos Palmares (AL) uma luz azul, parecia um disco voador. E quando eu cheguei perto era uma televisão, porque naquela época os prefeitos em vez de fazerem ponte compravam televisão e botavam na praça pública [...] E vendo aquele programa estavam cortadores de cana, boiadeiros, tratador de gado, pequenos funcionários... E daí quando vi aquilo pensei: cara, tem alguma coisa importante acontecendo no Brasil"
CACÁ DIEGUES


Tinha um sintoma, que era a modificação da cultura brasileira, a americanização. Aí fui ver onde estava o vírus deste sintoma [...] O que aquele momento tinha de importante, e foi decisivo para o filme, é que a cultura brasileira estava se cosmopolitizando"
CACÁ DIEGUES

A linguagem hoje do interior do Nordeste, do Norte, do Centro-Oeste ou de onde você for, é muito mais parecida com a linguagem do Rio e de São Paulo. Hoje as pessoas já falam como a televisão fala. A internet multiplicou isso por 1 milhão"
CACÁ DIEGUES


As mesmas cidadezinhas pequenas [do filme] têm sempre um lan house com três ou quatro aparelhos, mas têm. É uma outra cultura que está se formando, não sei no que vai dar [.../ Certamente, ‘Bye Bye Brasil’ é um filme premonitório, mas um premonitório não programado"
CACÁ DIEGUES





O filme é sobre um país que começa a acabar para dar lugar a outro que acaba de começar; sobre a coabitação do atraso com o progresso e da riqueza com a pobreza. Sobre as relações entre as pessoas, sobre a possibilidade de ser feliz com o outro. Da inter-relação entre o passado e o futuro. O filme retrata mudança e transformação.

Ao visitar a Floresta Amazônica e o sertão nordestino, há mais de 30 anos, o diretor Cacá Diegues viu um novo país nascer ali. Com a chegada da TV, novos hábitos culturais surgiram. E com a abertura de estradas, um Brasil atrasado e carente passou a alimentar o sonho de modernidade e desenvolvimento. Mas, tudo na na vida é relativo e tem um preço.

Nos subterrâneos e nas profundezas, subliminarmente e metaforicamente, com uma ponta de ironia e sarcasmo, Bye,Bye Brasil retrata também a inevitável aculturação trazida pela estrada e despejada, pela televisão, sem compaixão, num povo carente e sem educação.


Produção grandiosa até para os dias de hoje, “Bye Bye Brasil” cruzou o sertão nordestino e atravessou a Floresta Amazônica. A trupe mambembe na Caravana Rolidei rodava o sertão brasileiro vendendo ilusão e sexo para moradores e autoridades locais.


O grupo circense perdeu espaço no mesmo ritmo em que as “espinhas de peixe”, antenas de TV que trouxeram mudanças culturais, ganharam os telhados das casas e mudaram a paisagem urbana das comunidades isoladas. O auge e a queda da Caravana não deixam de ser um reflexo dessas transformações.

Chico Buarque, responsável pela trilha sonora, retrata tudo isso com maestria. Com poesia e com uma grande carga de ironia. Com graça, mas também com pirraça.