MANIFESTO DITADURA NUNCA MAIS:
50 ANOS DO GOLPE MILITAR
Cerca de 100 entidades que compõem os movimentos sociais e o movimento sindical no Brasil, assinam Manifesto no qual externam seu desabafo pelas descomemorações pelos 50 anos do golpe militar no Brasil.
No Manifesto, as entidades endossam a luta por verdade e justiça, a denúncia dos crimes praticados e o seu repúdio à violência. "Não podemos aceitar a criminalização dos movimentos sociais e populares, ou de suas manifestações. O uso de expressões “inimigo interno” e “força oponente”, bem como a utilização de armas letais e ditas não letais, devem ser banidos".
Leia o Manifesto na íntegra:
Hoje, 31 de março de 2014, completam-se 50 anos do golpe que implantou a ditadura militar brasileira, que atingiu violentamente nosso povo por longos 21 anos.
Mais de 70 mil pessoas foram presas e perseguidas e 437 foram mortas e desaparecidas, de acordo com levantamento realizado por familiares das vítimas nas últimas quatro décadas. Esse número pode chegar a milhares se considerado o extermínio de indígenas a mando dos governos militares.
A realização deste ato no prédio que abrigou a Operação Bandeirantes (OBAN), depois Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) do II Exército, onde foram torturadas milhares de pessoas e assassinadas dezenas de homens e mulheres, é simbólica para o movimento democrático e de defesa dos direitos humanos em nosso país. A experiência de reunir forças policiais e militares sob o comando do Exército, iniciada neste local, se estendeu para todo o território nacional e para países do Cone Sul.
Entre os anos de 1969 e 1978, sofreram torturas neste prédio mais de oito mil pessoas e mais de cinquenta delas foram assassinadas. Os assassinatos de militantes da resistência à ditadura eram acobertados por versões falsas de suicídios, atropelamentos ou mortes em tiroteios. Muitos deles tinham seus cadáveres entregues às famílias em caixões lacrados, para esconder as visíveis marcas das terríveis torturas sofridas. Outros são dados como desaparecidos, pois seus restos mortais até hoje não foram localizados.
A prática de tortura e de outros crimes contra a humanidade foi generalizada e sistemática. Este prédio é a clara demonstração disso, pois era possível ouvir, do lado de fora, o grito das pessoas torturadas por horas e dias seguidos. O terrorismo de Estado, executado pela ditadura, teve o comando do alto escalão das Forças Armadas e foi financiado diretamente por muitos empresários e suas entidades, que se beneficiaram com a ditadura militar e ainda hoje estão na elite econômica do país e na estrutura do Estado.
As frequentes visitas de representantes da FIESP e do Consulado dos Estados Unidos ao prédio do Dops não deixam dúvidas sobre os interesses e envolvimento do empresariado nacional e estrangeiro na continuidade da ditadura brasileira. Já é notório que a manutenção da estrutura da OBAN era feita pelo empresariado, que montou um sistema de financiamento para os torturadores como prêmio por sua ação criminosa. Além disso, forneceram carros, combustível, alimentação, dentre outros benefícios, aos torturadores como mostram documentos e testemunhas ouvidas pelas Comissões da Verdade.
Para combater o esquecimento e desmontar a estrutura autoritária que o país herdou da ditadura, é preciso que sejam identificados e punidos exemplarmente todos os torturadores, seus mandantes e financiadores. Só assim romperemos a dura herança deixada pela ditadura e que ainda acoberta os violadores de Direitos Humanos dos dias atuais.
A cultura da morte praticada pelas Polícias Militares é continuidade do que fizeram os assassinos do DOI-CODI, com a mesma falsa versão de resistência seguida de morte para ocultar o extermínio de jovens negros e pobres das periferias de nossas cidades. A banalização da violência por parte da PM é a pior herança da ditadura militar.
Além disso, há as propostas de reformas legislativas conservadoras como a Lei Antiterror e a Portaria denominada “Garantia da Lei e da Ordem” que ressuscitam a legislação ditatorial e restauram a figura do “inimigo interno” contida na Lei de Segurança Nacional.
Não podemos aceitar a criminalização dos movimentos sociais e populares, ou de suas manifestações. O uso de expressões “inimigo interno” e “força oponente”, bem como a utilização de armas letais e ditas não letais, devem ser banidos.
Por tudo isso, nós, representantes de organizações da sociedade civil, de entidades sindicais, de partidos políticos, de movimentos sociais e das Comissões da Verdade, estamos aqui para execrar e lamentar essa data, que é o DIA DA VERGONHA NACIONAL. E estamos aqui para exigir:
- Imediato cumprimento da decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no Caso Araguaia e reinterpretação da Lei da Anistia;
- Localização e identificação dos corpos dos desaparecidos políticos e esclarecimento das circunstâncias e dos responsáveis por suas mortes;
- Identificação e punição dos torturadores, estupradores, assassinos, mandantes, financiadores e ocultadores de cadáveres;
- Desmilitarização das Polícias e rompimento do ciclo de violência perpetuado pelas corporações;
- Que esta instalação policial que aqui ainda persiste, cujo prédio foi tombado pelo Patrimônio Histórico, seja imediatamente transformada em um Memorial em homenagem às vítimas, aos mortos e aos desaparecidos políticos da ditadura militar;
- Imediata abertura de todos os arquivos da ditadura, em especial da polícia técnico-científica do estado de São Paulo.
Neste local e nesta data, vamos lembrar o nome de cada um dos assassinados neste prédio, em memória e homenagem às suas vidas e lutas. Desse modo, reverenciamos e homenageamos suas histórias e papéis de resistentes, a quem tanto deve o Brasil.
Alceri Maria Gomes da Silva, Alex de Paula Xavier Pereira, Alexander José Ibsen Voerões, Alexandre Vannucchi Leme, Ana Maria Nacinovic Corrêa, Ângelo Arroyo, Antônio Benetazzo, Antônio Carlos Bicalho Lana, Antônio Sérgio de Mattos, Arnaldo Cardoso Rocha, Aylton Adalberto Mortati, Carlos Nicolau Danielli (Carlinhos), Dorival Ferreira, Edson Neves Quaresma, Eduardo Antônio da Fonseca, Emmanuel Bezerra dos Santos, Flávio Carvalho Molina, Francisco José de Oliveira (Chico Dialético), Francisco Seiko Okama, Frederico Eduardo Mayr, Gelson Reicher, Gerardo Magela Fernandes Torres da Costa, Grenaldo de Jesus da Silva, Helber José Gomes Goulart, Hélcio Pereira Fortes, Hiroaki Torigoe, Iuri Xavier Pereira, João Batista Franco Drummond, João Carlos Cavalcanti Reis, Joaquim Alencar de Seixas, Joelson Crispim, José Ferreira de Almeida, José Idésio Brianezi, José Júlio de Araújo, José Maria Ferreira Araújo, José Maximino de Andrade Netto, José Milton Barbosa, José Roberto Arantes de Almeida, Lauriberto José Reyes, Luiz Eduardo da Rocha Merlino, Luiz Eurico Tejera Lisboa, Luiz José da Cunha, Manoel Fiel Filho, Manoel Lisboa de Moura, Manuel José Nunes Mendes de Abreu, Marcos Nonato da Fonseca, Norberto Nehring, Pedro Ventura Felipe de Araújo Pomar, Raimundo Eduardo da Silva, Roberto Macarini, Ronaldo Mouth Queiroz, Rui Osvaldo Aguiar Pfützenreuter, Sônia Maria Lopes de Moraes Angel Jones, Virgílio Gomes da Silva, Vladimir Herzog e Yoshitane Fujimori
Que 2014 seja o ano da verdade e também o da justiça.
Ditadura Nunca Mais!
Punição aos Torturadores de Ontem e de Hoje!