POR ENILTON GRILL
2013, 16 DE FEVEREIRO
"(...) Às vezes penso que cantando mereço um pouco de vida.
Saldo em parte os meus compromissos e tenho então,
cada vez mais forte, a sensação da liberdade.
Por isso aprendo a cantar e canto."
GERALDO VANDRÉ, 1968
DA CONTRACAPA DO LP CANTO GERAL
Ele foi mandado embora e tratado, por alguns, como escória. Perdeu o trem da história e andou a esmo. Cantou pelo mundo, mas o mundo não era onde ele queria cantar. Tentou uma, duas e outra vez mais. Mas não deu. Entristeceu e não voltou mais. Vive, ainda, exilado num país por ele inventado. Não sei se está cansado, mas, mesmo quando fala, permanece calado. Talvez tenha sido torturado e ainda esteja condicionado. Não sei, ninguém sabe e acho que jamais se saberá se está arrependido, doente, deprimido, desiludido, constrangido, ainda revoltado ou já tresloucado. Nas raras vezes em que aparece se mostra reticente, às vezes irônico e outras irritado. Talvez esteja injuriado ou se fazendo de rogado. Não perde a chance de mostrar que está sendo importunado. Sempre sagaz, parece dizer: - Cuidem da vidinha medíocre de vocês e me esqueçam. Deixem-me em paz!
PRA NÃO DIZER QUE NÃO FALEI DE FLORES
1968. Rio de Janeiro. Maracanãzinho. Festival Internacional da Canção. Quem viu a apresentação de Geraldo Vandré, viu e não esquecerá jamais. Quem não viu não verá mais. O vídeo foi extraviado. Talvez esteja muito bem escondido. Ou corroído. Acho que foi destruído. Claro que ele foi esmagado, pisoteado, baleado, metralhado. Retorcido e queimado vivo. Mas jamais esquecido. Digo isso tomado de emoção: Com a certeza na frente e as flores no chão.
PEQUENA HISTÓRIA
Eu não vi. Mas ouvi. Uma , duas, três...e vou ouvir mil vezes mais. Mas foi a primeira vez que ouvi a que não esqueci e não vou esquecer jamais. Foi na casa de meus pais. Estávamos em 1976. Eu tinha 11 anos. Meu tio enviou de São paulo uma fita-cassete para o meu pai. No lado A, músicas do Chico (Buarque). No lado B, estava escrito na primeira linha: Geraldo Vandré (Caminhando) e, na segunda, com letras maiúsculas e garrafais: CUIDADO CENSURADO. Eu era uma criança. E, claro, me senti atraído pelo proibido. Os anos passaram. E eu, seja lá o que for, sou um curioso pelas coisas culturais. Talvez, quem sabe, eu seja um pouco mais. Acho o Chico genial e sou seu admirador in-con-di-ci-o-nal. E, como tal, sei sobre ele e a obra dele tudo o que quero saber.
NADA DE MEMÓRIA
Sei, por exemplo, que Sabiá, que na época era tida como uma canção quase alienada, foi justamente premiada e injustamente vaiada. Sabiá literalmente antecipou os fatos. Metaforicamente antecipou que a solidão acabaria e a solidão acabou. Que outro dia chegaria e um novo dia chegou. Sabiá é uma canção para além de seu tempo. É premonitória. É uma nova canção do exílio. É uma linda canção na história. Mais uma obra-prima buarquiana. E jobiniana também. Essa é a minha opinião e é tudo que eu sei. Mas Sabiá deve ser mais, muito mais. E se eu quiser saber mais, e o Chico quiser me explicar, tenho onde e a quem procurar. É que o Chico, antes mesmo de partir, cantou Vou voltar... e voltou. Em contrapartida, sei nada ou quase nada sobre Geraldo Vandré. É que o Vandré cantou Caminhando e enfrentou os generais. E quando se quer saber mais não se tem onde mais, os arquivos perderam a memória e aquele Vandré não existe mais. Ele foi e não voltou mais.
NADA DE MEMÓRIA
Sei, por exemplo, que Sabiá, que na época era tida como uma canção quase alienada, foi justamente premiada e injustamente vaiada. Sabiá literalmente antecipou os fatos. Metaforicamente antecipou que a solidão acabaria e a solidão acabou. Que outro dia chegaria e um novo dia chegou. Sabiá é uma canção para além de seu tempo. É premonitória. É uma nova canção do exílio. É uma linda canção na história. Mais uma obra-prima buarquiana. E jobiniana também. Essa é a minha opinião e é tudo que eu sei. Mas Sabiá deve ser mais, muito mais. E se eu quiser saber mais, e o Chico quiser me explicar, tenho onde e a quem procurar. É que o Chico, antes mesmo de partir, cantou Vou voltar... e voltou. Em contrapartida, sei nada ou quase nada sobre Geraldo Vandré. É que o Vandré cantou Caminhando e enfrentou os generais. E quando se quer saber mais não se tem onde mais, os arquivos perderam a memória e aquele Vandré não existe mais. Ele foi e não voltou mais.
Enilton Grill