*POR JOÃO BRANCO
A primeira vez que chorei em Cabo Verde, há quase vinte anos, foi por ter ouvido a voz de Cesária Évora, que se apoderou de mim como um furacão de alma e sentimento. Tinha acabado de chegar ao Mindelo e pela mão do músico Vasco Martins fomos a um bar de amigos, para um serão tranquilo de boa conversa.
Estava sentado, distraído com uma qualquer leitura, quando aquele espaço foi invadido por uma voz única, grave, possante. O disco era o “Miss Perfumado”, o CD que haveria de catapultar Cesária para a fama internacional, por via do mercado francófono e a transformaria na maior embaixadora da história do arquipélago, hoje no mapa global muito por responsabilidade do retumbante e espantoso sucesso da sua impar carreira.
Estava sentado, distraído com uma qualquer leitura, quando aquele espaço foi invadido por uma voz única, grave, possante. O disco era o “Miss Perfumado”, o CD que haveria de catapultar Cesária para a fama internacional, por via do mercado francófono e a transformaria na maior embaixadora da história do arquipélago, hoje no mapa global muito por responsabilidade do retumbante e espantoso sucesso da sua impar carreira.
No saudoso Café Royal, da mítica Rua de Lisboa, para onde ela ia quase diariamente, numa época em que ainda não tinha que viajar constantemente, com tournês que a obrigavam a ficar tão longe da sua cidade querida, a sua chegada de carro, sempre com um condutor próprio, e a entrada com os pés descalços no estabelecimento, eram dignos de um cerimonial que nunca mais esquecerei.
A mesa onde se sentava Cesária ia-se enchendo e esvaziando, à medida que ela recebia amigos, familiares, conhecidos ou curiosos. Pagava bebidas a todo o mundo, dava dinheiro aos pedintes, brincava constantemente com aqueles que a rodeavam, muitos já adivinhando que ali estava uma fonte inesgotável de talento e projecção. Na sua casa, sempre tinha a porta aberta, com o mesmo espírito generoso, próprio de uma grande matriarca.
Hoje, depois do choque inicial, a voz de Cesária Évora ecoa por toda a cidade do Mindelo. Nas ruas, nos cafés, nos bares, nos carros, nas vozes das pessoas. Um mendigo grita no centro histórico do Mindelo: Cesária já morrê! Hoje, Cabo Verde, é uma Nação que se curva, de pés descalços, perante a sua maior Diva.
João Branco,
diretor do Grupo de Teatro do Centro Cultural Português do Mindelo