segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

 


BALADA DE JOE HILL 

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“Meu corpo? Ah, se pudesse escolher, 
faria com que fosse reduzido a cinzas 
e deixaria as alegres brisas soprarem meu pó 
até onde existissem algumas flores murchas. 
Talvez essas flores murchas então 
voltassem à vida, florescendo outra vez. 
Este é meu derradeiro e final desejo. 
Boa sorte para vocês!” 

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John dos Passos, o grande escritor norte-americano, escreveu a trilogia “USA”, onde retratou os EUA, em sua face menos sorridente. Foi o retrato de uma América dominada por monopólios e trusts, por organizações de gângsteres e sindicatos infiltrados pela corrupção. Os personagens de “EUA” são anti-heróis amargurados, alguns idealistas e lutadores, outros céticos e cínicos. Numa constante alternância entre ficção e vida real, Dos Passos apresenta, em curtos “flashes” quase cinematográficos, uma galeria de figuras ímpares da História americana, não alinhadas no imenso rebanho, que fazia dos EUA uma coleção de funcionários gabarolas com contas de Banco demais, em palavras do autor. A trilogia foi editada, em Portugal, pela Portugália Editora, nos anos 60 do século passado, em sua coleção “Os Romances Universais”. Paralelo 42 (volume 30) foi traduzido por Helder de Macedo. “1919 e Dinheiro Graúdo” (respectivamente volumes 37 e 38) foram traduzidos por Daniel Gonçalves. Uma das figuras retratadas é a do sueco imigrado Joseph Hillstrom, popularmente conhecido como Joe Hill.



Transcrevemos, a seguir, algumas das linhas dedicadas ao cantor-sindicalista, patentes no 2º volume de “USA” sob o título de 1919 e escrito em 1932: “Um jovem sueco chamado Hillstrom meteu-se ao mar, calejou as mãos em veleiros e velhos cargueiros vagabundos, aprendeu inglês no castelo da proa dos vapores que faziam a ligação entre Estocolmo e Hull, e como todos os suecos sonhava com o Ocidente; quando ele se estabeleceu na América, eles lhe deram um emprego: limpar escarradores em um bar Bowery. Mudou-se para Chicago e trabalhou em uma firma de máquinas. Continuando sua marcha para o Oeste, ele alugou os braços dos senhores da colheita, arrastou-se pelas agências de empregos, pagou muitos dólares de comissão para conseguir trabalho em alguma empresa de construção, andou muitas milhas quando a comida era muito ruim, o capataz muito brutal ou os percevejos muito agressivos no galpão. Participou de greve, na Califórnia, costumava tocar sanfona na porta do barracão, à noite, depois da ceia, tinha um condão peculiar para transformar em rimas os brados de revolta”. 

 As canções de Joe Hill foram cantadas nas cadeias distritais e nas pensões rasas, por desempregados itinerantes, por trabalhadores das jornas. Em todos os lugares, onde um proletário se sentisse perseguido, explorado, marginalizado, soava uma canção de Joe Hill. Damos, novamente, a palavra a John dos Passos: “Em Bingham, Utah, Joe Hill organizou os trabalhadores da Utah Construction Company em um único grande sindicato, conseguiu-lhes salários mais altos, menos horas de trabalho, melhor comida. Joe Hill vivia em Utah, estado dominado pelo fundamentalismo religioso da seita Mórmon. Foi acusado, injustamente, de ter assassinado um merceeiro, chamado Morrison. Sua condenação à morte provocou vastas movimentações”. O cônsul da Suécia e o presidente Wilson tentaram obter um novo julgamento, mas a Suprema Corte do Estado de Utah manteve o veredicto. Joe Hill continuou a escrever suas músicas, no ano em que permaneceu na cadeia. Em 19 de novembro de 1915, eles o colocaram contra a parede da penitenciária de Salt Lake City. “Não percam tempo chorando minha morte. Organizem-se!”, foram as últimas palavras que enviou para seus companheiros. Joe Hill colocou-se diante da parede do pátio da penitenciária, olhou para os canos das espingardas e ele mesmo deu a voz de fogo.