sexta-feira, 21 de março de 2014



JOAN BAEZ EM PORTO ALEGRE


POR GUSTAVO BRIGATTI


DA ZERO HORA




Foram 33 anos de espera para ver e ouvir uma das maiores musas da contracultura. Uma demora que, pela reação da audiência, valeu a pena. Demonstrando um domínio raro de público e repertório, Joan Baez finalmente estreou em solo brasileiro, na noite desta quarta-feira, no Auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre. Da Capital ela segue para shows com ingressos esgotados no Rio, São Paulo e Recife.

Por aqui, Joan, 73 anos, encontrou um Araújo Vianna cheio – cerca de 2,8 mil pessoas saíram de casa para assistir a uma das figuras centrais da música folk voltada para o combate político e a denúncia social. E assistiram como se no palco se desenrolasse um culto, entremeando momentos de silêncio absoluto com explosões de catarse coletiva.

Os momentos de silêncio foram reservados, por exemplo, às canções que eram pouco conhecidas da maior parte da audiência – como a primeira faixa da noite, God is God, do seu disco mais recente, Day After Tomorrow (2008). Ou a doce Just the Way You Are, com Joan acompanhada apenas de piano e sua assistente fazendo segunda voz. Ou Flora, sucesso do cancioneiro de Peter, Paul and Mary.

Nas vezes que explicou, com a ajuda de uma "colinha" em português, o que uma determinada música queria dizer, também fez-se silêncio – até para, depois, rir com ela de sua inabilidade com o idioma.

Maior que o silêncio foi a exaltação do público – a começar pelo segundo número do show, Farewell Angelina, de Bob Dylan, recebida com aplausos e assovios. O ex-namorado apareceria mais uma vez e com a mesma boa reação do público em It's All Over Now, Baby Blue.

Bem recebida também foi House of the Rising Sun, clássico do repertório dos Animals e que ganha em emoção na voz suave, mas firme, de Joan. Emocionante também foi sua interpretação de Gracias a La Vida, pedida insistentemente pela plateia durante boa parte da apresentação.

A prova definitiva do quanto a cantora conhece seu público, no entanto, foi a inclusão de duas emblemáticas canções brasileiras de protesto. A primeira, Pra Dizer Que Não Falei das Flores, levantou a multidão, que cantou de olhos marejados e punhos cerrados como se 2014 e 1964 fossem separados não por 50 anos, mas por 50 dias.

Cálice, de Chico Buarque, que Joan já vinha cantando em suas apresentações pela América do Sul, dispensou a cantora do microfone, que deixou a cargo do público seu refrão.

O encerramento veio com Imagine – que bem poderia ter sido substituída por Blowin' In the Wind, prevista inicialmente no set list. Mas para quem esperou 33 anos, não dava para reclamar.