domingo, 5 de maio de 2013



À VINICIUS DE MORAES!


_por Enilton Grill


Rio de Janeiro. 1980. 9 de julho.

Pouco antes das sete horas da manhã, dona Rosinha, a empregada da casa de Vinicius, bate na porta do quarto de Toquinho. Tropeça nas palavras e mal consegue falar. O poeta está deitado na banheira. O corpo gelado e a respiração acelerada. Gilda, mulher de Vinicius, senta na cama paralisada. Toquinho de joelhos, trêmulo. O corpo debruçado sobre a banheira. O amigo tenta reanimar o poeta à bofetadas. Não dá tempo de mais nada. Gilda, desesperada, não consegue dizer e nem fazer nada. Agradece: Muito obrigada'.

Carlos Lyra, um dos parceirinhos de Vinicius, em vários depoimentos relembra o último encontro que teve com o poeta. Foi no restaurante Barbas, de Nelson Rodrigues Filho. Um repórter arrogante, de um pequeno jornal, interrompe o jantar dos parceiros e pede alguns minutos para uma entrevista. Vinicius e Carlos Lyra se olham - meio desconfiados - e convidam o repórter a sentar.

O jornalista começa a entrevista com uma pergunta que também será a última: 'Poeta, você está com medo da morte?' Vinicius coça o queixo, mais para ter certeza de que o rapaz ainda está no lugar, e responde: 'Não, meu filho. Eu não estou com medo da morte. Eu estou é com saudade da vida'.

Tom Jobim recebe a notícia em casa. Cai da cama. Sua mulher, Ana, tenta consolá-lo. Mas Tom não tem forças nem para levantar da cama. Chico Buarque ouve a notícia, acidentalmente, no rádio do automóvel. Vai direto ao cemitério. Mas Chico não consegue articular uma única frase. Toquinho, de volta do cemitério, roda a maçaneta da porta de entrada da casa do poeta e é tomado pela imagem de Vinicius esticado no sofá da sala. Mas o sofá está vazio. Toquinho chora sozinho: 'Meu Deus, Vinicius morreu'.

Baden Powell tenta espantar a tristeza convidando a ex-mulher Heloísa Setta para assistir um show seu, no Teatro Clara Nunes. Baden sobe ao palco chora, implora e canta. Não adianta. O amigo está distante. Depois, nos camarins, Baden, ao ver a ex-mulher entrar, diz: 'Você é quem mesmo?' Heloísa não entende nada. Inquieta, olha pro lado e vê uma garrafa de uísque pela metade. Pensa em Vinicius e entende tudo: Tristeza não tem fim, felicidade sim.

Vinicius viveu, amou, escreveu e cantou para fugir da morte. Para negá-la. Todos fazemos o mesmo. Mas ele era único; e não volta mais. Como o poeta nunca mais. Perto dele, somos todos nada mais que normais. Resta-nos, então, cantar mais e mais, e cada vez mais, à Vinicius de Moraes.


Velho amigo / Bom dia amigo / Samba em prelúdio
Se todos fossem iguais a você
Faixas 01 e 03 do LP
DE BADEN PARA VINICIUS
1981